- Essa história aconteceu com Néia Macedo -
Como explicar um momento inesperado, sem explicação lógica para seu acontecimento? O censo consagrou o termo “acaso”, e foi muito por acaso que ela o conheceu. Amigo de amigos, a simpatia dele foi o que lhe chamou a atenção. Era um tipo interessante, notava-se; e não apenas os seus, como também outros olhos o viam da mesma maneira, o que a intimidava e, por costume ou cacoete, tomou por mais certo que não seria nada; porém foi tudo.
Viam-se com certa frequência e começou a bendizer o famigerado acaso. Em pouco tempo já eram vários encontros acordados. Nada sério; tudo corria com uma leveza gostosa, acontecia da forma mais despretensiosa: um papo, uma troca de experiências, um apoio mútuo; porém uma vontade foi, pouco a pouco, lhe tomando de assalto, e quis converter a frequência em constância. Ele dizia que cresceu mais em sua companhia, que acolheu valores que não entendia e passou a ver o mundo como antes não praticava.
Mulher é um ser intrigante, de intuição inerente, algo inefável, mesmo que não queria, e a dela soava como alarme chato, daqueles que vemos em carros de bacana e que são ativados até pelo espirro alheio. Certo dia, ambas – sua intuição e o acaso – se fizeram presentes quando conversavam, e uma personagem que julgava ser mera figurante veio protagonizar seu conto e tomá-lo para si. Ela já não decidia o rumo do enredo que se desenvolvia e passou a ser leitora do que antes redigia – ou acreditava que assim o fazia. Então ativou o “status cacoete” e seguiu, até receber, poucos meses depois, o aviso pelo celular de que seria “tia torta”: “Cupidinha, vou ser pai!”.
A nova informação demorou a ser processada. Durante o “download” sua cabeça dava erro e resolveu andar, quem sabe a velocidade da conexão melhorasse. Bienal do Livro. Boa pedida e precisava ver gente, sem necessariamente interagir com elas. Queria movimento, barulho, estar só em meio àquele mar de cabeças, sem sentir-me tão só. Caminhou entre os stands até que viu algo familiar: o livro “O Pequeno Príncipe”. Passou a folhear as edições infantis quando um senhor, já idoso, perguntou: “Você trabalha aqui? Pode me ajudar?” Disse que não e ele insistiu: “É que quero comprar um livro bonito pra minha netinha.” Antes de pensar em chamar alguém, notou sua emoção ao falar da menina. “Ela está no hospital agora, sabe? Precisa fazer uma cirurgia no coração... Tão pequena e passando por isso, meu Deus!”. Procuraram um livro juntos, e o encontraram. Ele saiu e ela ficou ali, intrigada com esse bendito acaso, e escutou: “Filha, um bombom pra você e que Deus a abençoe!” Era o senhorzinho de novo, que voltou para agradecer a ajuda, sem saber que mais a ajudara do que ela a ele. E riu sozinha, pois esqueceu o que a corroia por dentro e o trecho de um poema de Alberto Caeiro emerge a sua memória: “E se Deus é as árvores e as flores / E o monte e o luar e o som, / Para que lhe chamo eu Deus? / Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar.”
Caeiro incluiria também o acaso em seu poema? Ainda hoje intui que sim.
- Por Néia Macedo -
5 comentários:
Como escreve bem a maestra, parabéns Néia, vc escreveu lindamente bem.Adorei.
¡Gracias, amigo querido! Tingluou opinión es un regalo para mí. Y gracias por animarme a escribir (o por lo menos intentarlo).
Besos y quédate con Dios.
corrección: TU OPINIÓN (no sería yo si no hubiera aparecido un error como éste)... :S
Que lindo Néia bjus juju
Gracias, Ju! Besitos.
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